sábado, 23 de janeiro de 2010

Saltar mais alto


Terceiro fascículo de Dicionário do Futebolês


  

     Na maioria das vezes em que há um golo de cabeça, a explicação mais utilizada é “Fulano saltou mais alto”. Rui Veloso chega mesmo a cantar o voo de Jardel sobre os centrais.
     A verdade é que se cabecear dependesse apenas ou sobretudo da capacidade de elevação, Javier Sottomayor teria sido ponta-de-lança. Se ser alto fosse suficiente para se ser um bom cabeceador, Shaquille O’Neal poderia ser um dos melhores. Se os atributos físicos fossem tão determinantes, um certo Martin Pringle que passou pelo Benfica teria sido um dos maiores cabeceadores de todos os tempos, em vez de ter sido uma dor de cabeça para os benfiquistas. No entanto, para se jogar bem de cabeça é fundamental saber usar a cabeça.
     Voltando a Jardel, era esse uso que o distinguia na capacidade de finalizar – e não só de cabeça. Fora da área, a bola era, para ele, um objecto estranho e esquivo. Nas proximidades da baliza, Jardel transfigurava-se e passava de desajeitado a génio. Ora, se é certo que não teria marcado tantos golos de cabeça sem os centros de Drulovic ou de João Pinto, o mérito do brasileiro estava na inteligência da movimentação, a ponto de conseguir marcar golos de cabeça quase sem tirar os pés do chão, conseguindo isolar-se no meio da multidão de defesas e médios-defensivos adversários que povoavam esse território tão hostil que é a grande área.
     Para finalizar a demonstração de que a frase futebolesa em foco é um automatismo vazio, basta ver o vídeo do golo que João Pinto marcou à Inglaterra em 2000, podendo concluir-se que, para se marcar um golo de cabeça, basta, por vezes, saltar mais baixo.




 
 
 
 

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