segunda-feira, 8 de março de 2010

Estamos a incomodar muita gente

Dicionário de futebolês





     Em Portugal, todos os clubes que ocupem qualquer lugar que não seja o primeiro da tabela classificativa (outra pérola do futebolês) são vítimas evidentes de uma conspiração que envolve árbitros, árbitros auxiliares, delegados ao jogo, dirigentes desportivos, polícias a cavalo, dois batalhões de artilharia, alguns deuses menores e pequenos crocodilos. Se não fosse toda uma série de acontecimentos, entidades e pessoas, todos os clubes que não estão em primeiro lugar, estariam, obviamente, em primeiro lugar. Por sua vez, o clube que está em primeiro lugar deve esse dúbio privilégio a uma série de “interesses instalados”, não havendo, nunca, a possibilidade de ocupar tal posição por mérito, mas apenas porque “está tudo comprado” e “está a ser levado ao colo”. É claro que este mesmo clube, mal perca o primeiro lugar, passará a integrar o coro dos roubados, injustiçados e espoliados.
     A frase em análise é uma das preferidas por jogadores, treinadores e dirigentes das equipas que têm o hábito de perder e, de preferência, muito. Assim, é vulgar, em conferência de imprensa, aparecer um homem de semblante sisudo que, diante de tantas forças ocultas que ocultam o demérito próprio, profere esta frase severa: “Estamos a ser prejudicados porque estamos a incomodar muita gente.”
     Normalmente, ninguém percebe por que razão uma equipa que se limita a perder jogos possa ser incómoda, mas é aí que esta frase misteriosa é explicada por outra com a mesma claridade: “Todos sabem de que falamos.” É nesse momento que desconfiamos de que o futebol é uma sociedade com rituais de iniciação mais insondáveis do que os da Maçonaria ou dos Templários. Qualquer um que afirme que é só um jogo em que ganha quem mete mais golos ou é ignorante ou vai em primeiro lugar.







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