Em todos os discursos aparentemente informados, as chamadas “aulas de substituição” surgem como uma das grandes medidas da legislatura. Entre outras virtudes que lhes têm sido atribuídas, estão a de ter obrigado os professores a passar mais tempo na escola, a de ter contribuído para a diminuição do absentismo docente e a de ser um dos factores do sucesso tão abundantemente propagandeado neste final de legislatura. Já dei a minha opinião sobre a (des)necessidade de os professores passarem mais tempo na escola e sobre a falta de rigor com que se fala do absentismo docente.
A ideia de manter os alunos ocupados sempre que falta um professor não merecerá contestação de maior, embora possamos perguntar qual é o mal de permitir que aproveitem essas ocasiões para jogar à bola ou para conversar despreocupadamente ou para estudar. De qualquer modo,o grande problema está na prática e nas conclusões apressadas que se têm retirado dessa mesma prática.
Após ter explorado os mitos de que os professores trabalham pouco e faltam muito, o Ministério acrescentou a este cozinhado outro ingrediente: as escolas tinham o dever de tutela dos alunos. Poder-se-á perguntar se alguma vez isso não aconteceu. Basta dizer que, durante o horário lectivo, a escola sempre foi legalmente responsável pelos seus alunos. Há, no entanto, um dado (mais um) que tem vindo a ser sonegado ao público: a quantidade de funcionários não docentes que as escolas têm perdido ao longo dos últimos anos, por razões meramente financeiras. Hoje, todas as escolas se debatem com esse problema: não há funcionários suficientes. O problema tem sido (mal) resolvido de duas maneiras: integrando provisoriamente pessoas vindas dos centros de emprego (nem sempre qualificadas e, portanto, preparadas para fazer face aos problemas) e obrigando os professores a, na prática, desempenhar essa função, através das “aulas de substituição”.
Como é óbvio, não há funções indignas e, portanto, nada há de indigno em tomar conta dos alunos quando não estão a ter aulas. O problema está exactamente no facto de isso não deveria ser uma atribuição de um professor. Deve esperar-se que o tempo passado com um professor seja pedagogicamente consequente, o que parece não acontecer, de acordo com aquilo que se vai sabendo.
Os relatos que vão sendo conhecidos do modo como funcionam as “aulas de subtituição” revelam que não servem para os professores ensinarem e são inúteis para que os alunos aprendam. Do ponto de vista do Ministério, isso nunca foi importante, tendo a ministra chegado a afirmar que esses tempos constituíam a altura ideal para os professores dizerem “umas graças”.
Mesmo que fosse aceitável que um professor possa limitar-se a tomar conta de alunos, o grande problema está no tempo que se perde. Resumindo: as “aulas de substituição”, entre outros factores, retiram tempo aos professores para preparar as restantes aulas; por maioria de razão, os professores não têm tempo para preparar as próprias “aulas de substituição”.
É importante que as escolas tenham condições para que os alunos sejam construtivamente enquadrados sempre que um professor falta, mas, tal como tem sido posta em prática, é uma medida puramente cosmética, inventada para satisfazer os encarregados de educação, reforçando a condição da escola como depósito de alunos. Para que uma medida destas tenha vedadeiro sucesso, não é aceitável continuar a sobrecarregar sempre o mesmo recurso, isto é, os professores.
O Ministério nunca quis saber se esta era uma medida com conteúdo, bastando-lhe, como de costume, a forma. As “aulas de substituição” apareceram, então, como causas do imenso sucesso divulgado no final da legislatura, sem a existência de estudos que o demonstrem, evidentemente. Na verdade, os milagres são como os mitos: não se explicam.
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