quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A propósito do novo Secretário do Estado - republicação

     Texto publicado no dia 13 de Abril de 2009. Para memória presente.

 

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Alexandre “Ace” Ventura


        As declarações de Alexandre Ventura, presidente do CCAP, obrigaram-me a escrever três comentários disparatados, um outro mais sério e uma proposta. Os três comentários vêm logo a seguir aos três excertos da reportagem do DN de ontem.

“Alexandre Ventura, que além de presidir ao Conselho Científico para a Avaliação dos Professores é também professor na Universidade de Aveiro, encarregou-se de visitar um terço das escolas que de forma voluntária se ofereceram para servir de casos de estudo da aplicação da avaliação. À sede do CCAP, na 5 de Outubro, em Lisboa, já chegaram 23 relatórios das equipas que visitaram os 30 estabelecimentos de ensino distribuídos por 17 distritos nacionais. “Neste momento podemos dizer que um dos factores determinantes no sucesso do processo é a liderança. Quando os órgãos de gestão são fortes e mais experientes, o processo decorre de forma mais serena”, adianta ao DN Alexandre Ventura, que acrescenta que, regra geral, os professores têm avançado e tentado resolver os problemas depois.”



Comentário: Este homem não precisa de inquéritos exaustivos, basta-lhe a intuição, a presciência. É uma Maya com menos seios, uma Blimunda que vê um país sem sair do gabinete, um Mestre Alves que poupa a vida às galinhas pretas. A ventura que tem no nome é do país que tal Alexandre tem. Agora se percebem as conclusões do relatório que pôs o primeiro-ministro a gritar “bravos” à Deborah.
Nas entrelinhas, recupera a ideia – clássica, como todas as ideias simples e brilhantes – da importância da liderança forte, diante da qual o subordinado alcança a alegria de deixar de pensar pela própria cabeça. O parágrafo termina em apoteose, com os professores a avançar e a “resolver os problemas depois”, como o touro na tourada.

Segundo Alexandre Ventura, “neste processo houve muita tendência para ouvir e ver o que os outros estavam a fazer e essas redes informais levaram as pessoas a articular as suas acções”. Mas a tese do presidente do Conselho Científico não implica uma critica à actuação sindical, “que naturalmente apelaram à luta dos professores”, até porque este foi um movimento muito assente na “proliferação de blogues, que juntamente com os outros actores criaram contra-informação, que acabou por influenciar os professores”.

Comentário: Fazendo uso de uma rara lucidez no campo da psicologia de massas, conclui esta coisa hedionda: as pessoas ouviram e viram o que os outros andavam a fazer e – horror! – articularam as suas acções. A culpa, no entanto, não é dos professores, que, “coitadinhos”, foram influenciados. Mesmo os sindicatos são desculpados, porque mais não sabem fazer do que apelar à luta, estás-lhes no sangue, pobrezitos. No fundo, isto foi tudo um problema de más companhias. Uma vez desmascarados os blogues e “os outros actores”, os professores poderão, guiados pela mão das lideranças fortes, redescobrir o caminho recto.

“No entanto, para o responsável, a realidade nas escolas é bem diferente. “Quando vamos ao terreno, quando percebemos que 75 por cento dos professores entregaram os objectivos individuais, temos um retrato bem diferente daquele que passou para a opinião pública”, conclui Alexandre Ventura.”


Comentário: É sempre de louvar a “ida ao terreno”. É a atitude do homem disposto a sujar as mãos, do ser superior que compreende o povo, que tem para o professor transviado uma palavra de consolo, é um pastor da “Igreja dos 75 por cento”. Pode, agora, a opinião pública ficar a conhecer a verdade, ver a luz, afinal.


            Agora, a sério:
 

O senhor Professor Alexandre Ventura poderia, se estivesse genuinamente interessado, realizar um inquérito, a fim de saber se os professores estão de acordo com esta avaliação e porquê. Em vez disso, faz de conta que os números têm significado, papagueando o discurso ministerial. Depois de ter participado no célebre relatório praticamente-da-OCDE, Alexandre Ventura faz questão de se manter do lado errado da História da Educação em Portugal, copiando os tiques do costume: alinhavar conclusões sem estudos que as sustentem e aceitar aparências como realidades.

A proposta:

            Gostaria de deixar aqui um desafio: se há professores que entregaram objectivos individuais e não concordam com a avaliação, seria importante tornar isso público, mesmo que implique assumir que o fizeram por medo ou por comodismo. Desse modo, seria possível mostrar à opinião pública o que pensam verdadeiramente os professores.

2 comentários:

  1. Como sabes, eu apresentei objectivos individuais porque não posso aceitar que uma "senhora" que nada sabe de educação venha para a praça pública dizer que os professores não querem ou têm medo de ser avaliados. Eu não tenho qualquer problema em ser avaliada; era-o quando estava na privada de 6 em 6 meses, e sou-o agora, no exercício das minhas funções docentes de 90 em 90 minutos. Obviamente que não concordo com este modelo, que é totalmente descabido e altamente prenicioso. Avaliação sim, mas que seja construtiva e feita por pessoas isentas e que saibam pelo menos tanto como nós, quer a nivel cientifico como pedagógico.
    Paula Vaz

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  2. Eu sei, cara conterrânea. No texto, só digo que era importante que as pessoas revelassem o que pensam, mesmo que tenham entregado os objectivos por razões que possam ser consideradas menos nobres, sendo que não me cabe a mim fazer esses juízos de valor.
    Quanto aos teus argumentos, penso o seguinte: em primeiro lugar, não me interessa o que gente desclassificada pensa sobre os professores; em segundo lugar, os objectivos individuais não constam do Estatuto da Carreira Docente; finalmente, esta aplicação forçada de tudo o que seja linguagem empresarial - caso da definição de objectivos - a um mundo que não é empresarial é um erro crasso.
    Também quero ser avaliado, de preferência por quem souber mais do que eu, porque isso implicará que estou a aprender e a ser melhor professor.

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